quinta-feira, 30 de julho de 2009

Elas aí estão

Não via a hora, mas elas foram-se aproximando entre o meu cansaço invencível e o raiar do sol e das elevadas temperaturas. São as merecidas férias depois de dois anos de trabalho.
Estou de férias e para não variar vou para a Serra da Estrela, ver a minha querida aldeia e suas – e minhas – gentes. Gentes do campo, do trabalho árduo da lavoura, gente simples e hospitaleira. Ainda se bebe vinho tradicional na minha aldeia, come-se a broa de milho cozida em fornos de tijolo burro, assam-se as sardinhas frescas e provam-se as batatas novas. O ar é puro e a verdura e o colorido das flores selvagens pinta um quadro idílico que alegra a vista, a água corre agora pouco solta e só em terrenos mais íngremes se lança em velocidades furiosas. Mesmo assim lá vai serpenteando no seu incansável ciclo pelas cabeceiras até se despenhar violentamente no seio do seu senhor: rio Alva. Ali se entrelaçam num casamento perfeito.
Penso que quem de vós não teve a fortuna de nascer numa aldeia, seja da beira, do Alentejo, de Trás-os-Montes, do litoral Centro e Norte ou do teclado de serras do Minho, não sentirá nalguns retalhos de momentos falta e saudades da terra que viu crescer e deu abrigo aos seus filhos.
Muitas vezes ainda sonho com as aventuras na ribeira de águas cristalinas onde aprendi a dar as primeiras braçadas e para onde fugia aos domingos na hora da missa – que Deus me perdoe – ou daquela ocasião que todos os rapazes abalaram do recreio da escola em direcção ao monte só para brincar às escondidas. Só não me quero lembrar das reguadas que levamos ao outro dia. Ainda rezávamos todos os dias na escola e a professora tornara-se uma referência de sabedoria amizade e respeito para o resto da vida. Era amiga todos os dias e dura quando assim era necessário. Não foi por isso que ficamos traumatizados ou que não aprendemos matemática, língua portuguesa ou meio físico, a minha disciplina preferida.
Conhecia todos os caminhos da minha terrinha da mesma forma que sabia as árvores onde os melros e o resto da passarada faziam o ninho. Na Primavera acordava com o chilrear dos pássaros que percorriam as árvores que ladeavam a minha casa. Hoje em dia vêem-se arrepiantemente poucos!
No final da escola, que terminava às quinze horas, íamos tratar das cabras e das ovelhas de cada um, dava tempo de sobra para brincar e para fazer os deveres com paciência.
Enfim, estou de férias e vou revisitar a minha aldeia onde os mais pequenos ainda brincam nas ruas e os mais velhos descansam nas sombras frescas das praças e jardins.

domingo, 19 de julho de 2009

Faz tempo...

Pois é, tenho andado atormentado com vários assuntos. Primeiro foram as avaliações finais dos cursos profissionais que só terminaram completamente à uma semana atrás, depois recebi uma convocatória para passar a minha bic vermelha sobre a tinta escorrida em palavras azuis dos exames nacionais do ensino secundário.
Ora, logo aqui surgiu-me uma tema tão pertinente nos tempos que correm que não consigo deixar de vos pôr a par. Uma das questões do exame continha já uma boa dose de campanha eleitoral, tanto assim que pedia a quem estava à prova para apresentar duas consequências positivas da construção do aeroporto na “margem sul” de Lisboa. Ou seja, nem há hipótese de confrontação ou debate de ideias, ou indicas duas consequências positivas ou a bic castradora de palavras teria que desenhar um esboço de um círculo impreciso de O valores de cotação na margem direita.
Nunca pensei que a campanha eleitoral de um partido descesse tão baixo e instrumentaliza-se o futuro de tanta boa gente. No mesmo grupo, inexplicavelmente, pede-se que analisem uma imagem supostamente representativa de campos agrícolas em forma de círculos que, pelos vistos, só um mago ou vidente consegue alcançar os itens pretendidos na resposta. È precisa uma imaginação sobremaneira fértil para chegar as conclusões pretendidas.
Mais uma vez a minha massa cinzenta não encaixa factos para tanta gente simples. Afinal porque não são os exames concebidos por professores que labutam diariamente no terreno, ao invés de o serem por gente afastada da realidade, do campo de batalha.
Diga-me quem tenha resposta porque razões existem professores - há muitos chamados titulares que sempre escolheram as as suas turmas e não fizam a mínima ideia do que é lidar com determinadas turmas e diz o ministério que servem para fazer valera sua experiência junto dos mais novos - que nunca leccionaram a turmas complicadas com meninos tão queridos e inocentes, não raras vezes maiores de idade e conscientes do que fazem. Afinal por que carga de água se concluiu que toda a gente tem que estudar. Donde surgiu a ideia de dar de mãos beijadas um diploma a alguém que em três meses concluí o nono ano de escolaridade ou o décimo segundo num ano. De que valem as estatísticas quando na prática grassa o facilitismo, a falta de carácter e frontalidade e a iliteracia.
Assim tenho passado o meu tempo, porque contrariamente ao que muita gente diz não tenho três meses de férias, tenho apenas vinte e dois dias e confesso que não consigo ver mais papéis e relatórios a minha frente.
Estou capaz de encher um ecoponto azul com tanta árvore destruída para tão infame fim. A tecnologia é tão avançada mas continuamos a derrubar a floresta indefesa para fazer papel, por vezes tão dispensável. Ainda por cima é tão duro que nem para limpar o rabo é adequado.