sexta-feira, 21 de agosto de 2009

A saga das coimas convertidas em dias de férias

Finalmente compreendi a cruzada inflexível das forças de segurança portuguesas pela busca incessante da coima fácil. Digo fácil, porque algumas são necessárias e devem ser justamente aplicadas, ao contrário daquelas que são insensatas e fruto de mau âmago dos operantes e principalmente de quem têm o cú bem assente e acomodado na fofa cadeirona almofadada da secretária.
Isto tem tudo a ver com objectivos!
Tudo se passa da seguinte maneira: quanto mais coimas forem aplicadas pelos guitas mais dias de férias acrescentam e gozam. Eles dizem que os elementos destas forças são premiados pelo extremo zelo no cumprimento do seu dever e eu digo que são meritados pelo excesso de zelo.
Não queria atear mais o fogo mas a história real que tenho para vos contar é tanto hilariante como de descomedida intenção e acção de dedicação.
Um senhor aqui perto da minha aldeia tinha o sonho de criar um museu, onde ao longo de anos de intensa pesquisa e busca incansável reuniu uma panóplia de artefactos representativos dos nossos modos de vida – especialmente dos afazeres da lavoura, da resina, das artes e ofícios características da serra –, entre os quais se encontravam meia dúzia de mosquetes utilizados pelos nossos antepassados durante a caça. Eis aqui o objecto desta crónica: os mosquetes.
Trata-se de armas de fogo bastante remotas, constituidas por um fuzil capaz de projectar pequenas bolas de chumbo, através da explosão da pólvora doseadamente inserida pelo cano abaixo.
Para espanto de toda a gente, um dia qualquer, não sei se fazendo sol se chovendo, batem na porta os militares da guarda para retirarem essas peças do bem aperaltado museu. Não sabendo por obra de quem eles tomaram conhecimento, ficou na retina a sua acção, zelosa, donde talvez resultaria motivo de superior enaltecimento ao seu louvável trabalho, porque desarmaram numa missão excessivamente arriscada um pouco da riqueza daquele local de cultura, relembradando vivências e saberes doutras épocas.
São armas remotas que não causariam mal qualquer a uma pessoa, pois nem tão-só estavam em condiçõs disso. Encontravam-se com ar velho e ferrujento e só postavam ali como artefacto antigo para o visitante gozar com a vista. Quiçá noutros tempos teriam sido uteís em conquistas ou até maléficos ententes. As armas que ferem e matam desalmadamente a sangue frio, essas estão por vezes em mãos criminosas de má intenção. Estão escondidas, operacionais e podem fazer mal.
É assim que ajem por aqui.
Perdem mérito, respeito mas ganham férias.

domingo, 2 de agosto de 2009

Eles andem aí

Anda tudo com os azeites cá pela minha santa e frondosa aldeia. A GNR - aqueles senhores e senhoras mal-humorados, resmungões e de poucas falas – decidiram deixar a cidade e as estradas mais movimentadas e investir no campo, onde a pacatez das sua gentes em aliança a alguma ignorância conduzem à coima fácil.
Fiquei estupefacto com os sentimentos anti GNR, havendo já quem fale em perseguição e mau íntimo das operações encetadas. Tudo cozinhado conduziu a esta ideia um pouco incaracterística neste povo que conheço faz trinta e um anos: “eles não nos protegem, nem é a pela nossa segurança que trabalham, querem é dinheiro fácil de quem é honesto e trabalha".
Até ao ano passado eu não partilhava desta ideia, mas pelo que vi enquanto viajei pelas estradas de Portugal e da Velha Europa fui obrigado a pensar dessa maneira.
Deslocando-me agora da minha aldeia, estendo-me ao palco dos milhões de quilómetros do asfalto europeu: uma certa vez procurava um cliente em Espanha perto de Barcelona e quando vi um carro patrulha dos Mossos de Esquadra, assinalei a minha intenção de imobilizar o Virgolino em segurança para me dirigir a eles; cumprimentei-os e com a morada escrita num pedaço de papel onde havia rabiscado já um esboço do trajecto, perguntei-lhes com elevada educação se podiam indicar-me onde ficava. Pois bem, viraram-me má cara e ainda recalcaram que o procurasse eu, pois não tinham nada a ver e, como se não basta-se, pediram-me os discos e todos os documentos e ainda passaram revista ao tractor e semi-reboque.
Estava tudo conforme os cânones da lei, atiraram-me com os discos para a mão, grazinaram e deixaram-me ali plantado como um penhasco. Ainda fiquei estupefacto durante uns segundos e posto isto fui à minha vida. Outras situações muito semelhantes acabei por vivenciar e só na Alemanha, em Sinzig, a uns quilómetros de Bona, tenho boas memórias da polícia.
Voltando à minha aldeia não se fala por agora de outro assunto. Escondem-se atrás das árvores da berma da estrada para fiscalizar quem saí dos campos agrícolas, mandam parar todos os tractocarros, às cinco da manhã já estão à cola de quem madruga para o trabalho, fazem esperas junto dos cafés, ao mesmo tempo que se roubam igrejas, bens e propriedades, e não se vêm acções conclusivas.
É óbvio que não ganham dinheiro com isso, e, desta forma, o povo conclui que mesmo quando se age em conformidade com a lei, não o fazem porque se está a cumprir a regra, mas sobretudo porque dá dinheiro, esse é o que os move e é o fruto desse trabalho que apresentam aos seus superiores. Ou seja, não aplicam uma coima a alguém porque trás um passageiro no tractocarro e pode tornar-se perigoso para essa pessoa, mas sim porque esse facto é passível de encher os cofres, não pensando sequer na segurança ou não do passageiro.
Nesses meios tudo gira assim e daí que estas gentes começam a sentir os exageros e actos de má fé, questionando-se o respeito que até à pouco tempo se tinha pelo trabalho desses senhores. Talvez se houvesse preocupação com o que realmente interessa a sinistralidade rodoviária poderia diminuir e as pessoas se sentissem mais seguras.