quinta-feira, 26 de março de 2009

O Homem por detrás da máquina...

Lá vai o cabrão no camião – dizem muitos energumenes que infelizmente ocupam lugar neste mundo. Ocupam porque ao belo opõe-se o feio, ao mal o bem, ao triste o feliz, ao culto o inculto, ao sensato o insensato. Todos têm lugar nesta bola redonda, mas a compreensão do lugar do outro poucos atingem. Além disso cabrões há muitos e nem precisam de sair de casa por muitas horas para o serem.
Lá vai o brutamontes, será que um ser daqueles tem cerebro como a gente comum…terá sentimentos como os demais? Não deve…afinal é um camionista, e, como tal, foi desprovido de coração e emoção; faz vida num camião nem precisa de amor, carinho, compreensão – alvitram outros convencidos que falam uma verdadade irrefutável.
Lá vai o porco, sempre com aquela suada camisola de alças, bucho protuberante e cara de mau sem remédio. Tanto tempo que andam por lá deve ser só mulheres da má vida?! Sem tomar banho, a cozinhar ao lado do camião no meio do lixo. Também são camionistas, que se espera, tão-só feios palavrões, daquela boca não sai conversa direita, andam num camião nem precisam de saber falar qualquer coisita – defendem alguns obstinados mais pobres de vida.
E o homem por trás do camião? Esse é um Homem que sente, que pensa infinitamente sobre os seus que ficaram longe, que deixou e não sabe se volta a ver, a sorrir com eles, a sentir o seu amor, amizade, carinho; enfim, as sensações que fazem correr o sangue desde as veias mais finas às grandes artérias e repetidamente bater irrequietante o coração. Pulam as saudades constantes no pensamento menos pensado, pois não se pensa por pensar, pensa-se no que não se queria pensar: nos seus, no que ficou por fazer.
Quando se fecha a cortina, antes dos sonhos se apoderarem do corpo cansado mais uma vez a tormenta dos pensamentos, duros e decididos a ficar e moer. A saudade atinge o seu zénite. Não ter ninguém a quem dar uma palavra, a quem lançar um simples olhar e dizer boa noite. Resta imaginar, talvez abrir um pouco a cortina, olhar de encontro ao céu incendiado de estrelas e pardo do luar e saber que algures naquela direcção está alguém que nos faz existir e não fomos esquecidos pelos muitos quilómetros. Sentir que se faz parte do mundo e que por mais um dia não fomos esquecidos.
Afinal os camionistas são prisioneiros de sentimentos, o feio, porco e mau é uma pessoa como todas as outras. É feito da mesma massa e de todos os componentes humanos das restantes pessoas comuns. Compleição de carne e osso, impregnada de um coração amanteigado de emoções, razões, tentações, dor.
É um homem que sonha como todos os outros… e até sonha mais…

sábado, 21 de março de 2009

Hoje é dia mundial da poesia e, como não o poderia deixar de fazer, aqui vai a minha contribuição(ehehehehehe):

Vips

Têm-se tudo mesmo à mão
Basta sorrir sem querer
É logo aplaudido pela multidão
Nem é preciso saber ler

Sexo, telenovelas, vips e coisas belas
Vidas que não são só delas
Mesmo sem nada fazer
Fazem o país crescer?

Na capa está a Clara Bela
Não conhecem? incultos!
Só sabem lançar insultos
A essa boa esposa na telenovela

E se virem com atenção
Vão encontrar o Tó Manel
Aquele que não era ninguém
E agora é estrela de televisão.

Joni

sexta-feira, 13 de março de 2009

Música Viajante

Rompo o tempo e os testes para vos falar de música, especialmente aqueles sons que beligeravam arduamente com o rocar de vida do Virgolino. Dificilmente o abafava.
A música é, para mim, uma arte divina, um hino de magnificiência. Tanta música inundava os meus ouvidos e se despenhava na alma durante as longas viagens.
Por vezes – muitas que foram – conseguiam transportar-me para um mundo além, um mundo que me fazia esquecer o grande volante, a linha contínua e descontínua, o assobiar das ultrapassagens, os horários rígidos, os minutos a mais, a ausência, a estrada, a policia.
Um mundo enorme de libertinagem do espirito no seu estado mais límpido e sensivel.
Tratava sempre de destinar um artista ou grupo para me fazerem companhia durante os doze dias que deambulava nas curvas do asfalto europeu.
Zeca Afonso, o mestre da intervensão portuguesa, que fez da música uma arma mordaz, espalhava liberdade por cada bafo de ar da cabine do meu camião. Cantigas de Maio, Maria Faia, Vampiros… e eu acompanhava, pese embora por muita pena minha não ter voz para a música. Sou daqueles que estrago.
Numa viagem que fiz à Alemanha destinei os dozes dias, doze horas de ABBA por dia. Aquelas músicas simples mas melodiosas que repelem o mau estar e atraiem como um potente íman a alegria de viver uma vida nem sempre fácil. Música após música e volvia ao início dos albuns durante doze dias, doze horas por dia. Uma incessante repetição que não cansava.
Cantava ao infinito do horizonte, dos montes e vales dos rios e ria-me sozinho. Uma altura dei comigo a rir-me tontamente e não sabia a razão. Também não tinha dado nenhuma passa nas ervas de folha redundantemente triangular que fazem rir. Estarei louco – pensei cá para os meus botões. Não estava, apercebi-me sensatamente. Era tão só o efeito dissolvente da tristeza presente na música. Melodias que me elevavam e sideraram ao um estado de satisfação ilimitado.
Quando não ouvia música falava para o GPS e berrava como um louco com os outros passantes das estradas. Falava abundamente julgando-me um Deus a corrigir todas as manobras desses outros que mais não eram senão outros cavaleiros do asfalto, uns maiores outros mais pequenos, mas todos membros da mesma tribo. Lançava todas as pragas mais maliciosas e espezinhava a língua desfazendo-me em palavras à Norte.
Outra semana seria Bob Dylan, aquele que a partida não tem voz de cantor compensando essa pecha com letras únicas e de grande fundo afectuoso e crítico.
A terna e pausada voz do Caetano transbordava-me do meu mundo para um outro mundo que existe a par meu, que se esquece porque é triste, tardando a sua solução, caso algum dia chegue.
Liderando o meu Top os velhinhos Pink Floyd, aquilo que eu considero, como uma certa vez ouvi a alguém – que me perdou-e pois já não sei quem foi – muito mais que um estado excelso da música: a tranfiguração da música num estado de alma.
A descer os Pireneus calhava sempre bem um cheirinho de adrenalina dos Xutos, os dinossauros do Rock nacional, que nunca me canso de ouvir, simplesmente porque não cansa e prontos.
A Amália, a eterna e imortal vóz de Portugal, a alma lusa da música. Adoro a voz que é a vos de todos nós porque todos nós temos a Amália na voz.
Não raras vezes interronpia os cds para ouvir as rádios portuguesas lá Fora, em Orleans e Paris ouve-se a nossa língua, assim falada tal e qual como no nosso pequeno Portugal. Tão bem que sabia até ouvir o folclore nacional em terras alheias. Sentia-me mais próximo de casa.
Foi entao que compreendi o que é ser emigrante e ter a lágrima no canto do olho quando ouvimos a nossa língua fora do nosso país e temos orgulho nas nossas raízes, sempre a contar os dias, as longas horas e segundos para ver de novo a placa Vilar Formoso….o cheiro de Portugal.

sábado, 7 de março de 2009

Conversa da treta

Passou-se ontem a dois passos de mim enquanto esperava pela minha vez de ser atendido numa loja da labirintica e empedrada baixa farense.
Eu esperava e ouvia, com atenção fincada, duas jovens com cerca de dezoito anos que mantinham um diálogo aceso sobre qualquer coisa. Digo qualquer coisa, porque não cheguei a entender o fio da meada nas palavras soltas que saiam das suas adornadas bocas.
Ya men, tipo tás a ver eu até curti bue a cena, altamente, até os maus país disseram que era bue a frente – disse uma. Nisto responde a outra no mesmo código: tipo, eu amei, até lhe disse que era bacano tás a ver, assim podia resolver as merdas e curtir bue a night, o meu love tá comigo e também me disse que era fixe e achava uma beca bacana.
Bem, e foi isto que eu ouvi. Penso que será um novo código linguístico que espera aprovação do estado para ser instituído nas escolas portuguesas, para que todos passem e amem a escola que até agora é bue chata, tão a ver…
Esqueci-me de vos dizer que enquanto dialogavam não largarm o telemóvel durante um segundo para visualizar e responder a mensagens.